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“O Semiárido é viável, a Caatinga é rica, o problema está na questão fundiária”, diz participante da 2ª Rota Estratégica de Aprendizagem.

“O Semiárido é viável, a Caatinga é rica, o problema está na questão fundiária”, diz participante da 2ª Rota Estratégica de Aprendizagem.

José Moacir dos Santos, colaborador do Irpaa desde a sua Fundação, militante social da luta por uma política nacional de Convivência com Semiárido, pedagogo, em entrevista ao Eixo Comunicação do Irpaa fez uma abordagem temática sobre a sua participação e a realização da 2ª Rota Estratégica de Aprendizagem do Programa Semear. Com a temática “Promoção da Agroecologia e a construção social dos mercados na perspectiva da Convivência com o Semiárido”, a Rota Estratégica aconteceu de 08 a 15 de junho de 2013, em municípios dos Território Sertão do São Francisco (Uauá, Juazeiro e Remanso) e Bacia do Jacuípe (Várzea da Roça), com a participação de diversos atores sociais, representantes de entidades da sociedade civil e governamentais, produtores/as e agricultores/as familiares, pesquisadores/as com atuação no Semiárido Brasileiro, entre outros. Acompanhe a seguir, o que os temas como a Caatinga em pé, o tamanho ideal para a terra no Semiárido, a economia da Caatinga, a cultura do estoque, a organização comunitária, entre outras questões, tem a ver com a proposta de Convivência com o Semiárido, com o trabalho que o Irpaa desenvolve há mais de 20 anos e a relação disso tudo com a Rota.

Irpaa – Dentro da proposta temática da Rota surge uma questão que gostaríamos de esclarecer para os nossos leitores, que é a Economia da Caatinga. O que é essa Economia da Caatinga?

José Moacir dos Santos – É um termo novo que nós estamos trabalhando. Desde a época da Colonização sempre se desconsiderou a Caatinga como um bioma inviável. Então, teria que derrubar a Caatinga para criar boi, plantar capim, milho, feijão, irrigar. E hoje, com as sucessivas secas, a gente vê que todos estes empreendimentos foram fracassados e o que sobrevive de fato é a Caatinga. Nessa Rota, a gente pode perceber que pelo menos 80% da renda das comunidades e famílias visitadas vêm da Caatinga, que é a questão do mel que as abelhas colhem na Caatinga, a criação de cabras e a produção de leite de cabras, o que os animais comem na Caatinga e o extrativismo de frutas como o umbu e o maracujá, salvo isto apenas a mandioca tem um pouco. Então, isso quer dizer que a grande força do Semiárido está na Caatinga em pé. A discussão da economia da Caatinga é como tornar economicamente viável os vários produtos e bens que a Caatinga oferece, que até hoje não foram reconhecidos pela política pública, tanto na parte de crédito, como de assistência técnica, como também de mercado.

Irpaa – Com isso, pode-se comprovar que essa Economia da Caatinga vem movimentando estas comunidades, tanto em termos de produção como organização comunitária?

Moacir – Isso. A seca pela qual estamos passando agora trouxe muitos problemas, mas também tem coisas positivas. E uma delas é de fato perceber o que sobreviveu a esses três anos de seca, a Caatinga. É preciso perceber isto como potencial e transformar em bens, serviços e mercadorias. Esse período seco tem propiciado isto. E junto vem a discussão da terra. Percebeu-se que se fosse viver de milho e feijão precisaria de 5 a 10 hectares, mas para viver da Caatinga, da criação de animais [cabras e ovelhas], do extrativismo é preciso de uma área maior, 50, 80, 100 ha. Então, a Economia da Caatinga não é somente a questão técnica do que produzir, comercializar, mas também esse reordenamento fundiário, necessário para o desenvolvimento sustentável da Caatinga. Essas comunidades onde a gente visitou na Rota de Aprendizagem, as que foram bem sucedidas, tinham terra suficiente (acima de 60 ha) para produzir a sua economia, tinham terras coletivas e terra individuais, onde fazem uma gestão compartilhada e toda a comunidade se beneficia do recurso da Caatinga naquela área, mesmo em áreas como Várzea da Roça, que não se considera Fundo de Pasto, mas também tem as áreas coletivas, tanto as áreas de cultivo da mandioca (lá é forte), como as áreas de pasto onde os animais podem viver em áreas coletivas. A dificuldade é que lá ainda são áreas muito pequenas. Outras duas comunidades que a gente andou, em Uauá e em Remanso, já tinham áreas em quantidade mais apropriadas. Na primeira, a gente viu que tinha várias famílias que de fato ainda não tinha terra para desenvolver uma atividade econômica suficiente e que dependiam de diárias para terceiros e da aposentadoria para complementar a falta de terra que tinham. Então, veja, a falta de produção e de renda não era por conta do clima, mas por conta da questão fundiária. Se aquela família tivesse uma terra maior, ela não precisaria buscar outras rendas, poderia viver dignamente da terra.

Irpaa – Essa foi uma constatação também ao longo da rota...

Moacir – Isso. Porque essa ideia da Agroecologia ela vem do Sul, Sudeste do País, litoral do Nordeste. E chegou aqui no Semiárido como Agrofloresta, agroecologia, então se pensava muito no cultivo de milho, feijão, plantas exóticas, vindas de fora, caju, cajá, manga, abacaxi. Isso não se adapta no Semiárido. Então, era sempre uma barreira discutir agroecologia no Semiárido, que não dá para plantar milho, feijão e abacaxi. Então, essa Rota percebeu que a nossa Agroecologia é muito mais ligada de fato à vegetação nativa, à flora nativa do que em outras regiões. Aqui eu não preciso desmatar para ter renda. Eu preciso recaatingar o que me dá mais renda, o umbu, o maracujá e outras plantas nativas da Caatinga. Eu preciso, em vez de derrubar estas plantas para plantar milho e feijão, plantar mais umbuzeiros, mais maracujazeiros, mais plantas forrageiras da Caatinga. Então, a agroecologia no Semiárido tem outro desenho diferente da Agroecologia em outros biomas.

Irpaa – Como a iniciativa da Rota vem contribuir com a proposta de Convivência com o Semiárido desenvolvida pelo Irpaa e por outras instituições que estão aqui fazendo este trabalho ao longo dos anos, tentando pautar uma política nacional de Convivência com o Semiárido?

Moacir – Essa rota por conta da diversidade e número de pessoas presentes, acho que contribui muito no sentido de solidificar ainda mais essa proposta de Convivência com o Semiárido. Sair da ideia do Nordeste e focar de fato o Semiárido, e pensar de dentro do Semiárido, não trazer aquele projeto de fora pra cá. Mas o que é que ta dando certo de fato na ponta, nas condições de campo e, principalmente, no ano de seca como este? Acho que isto foi o que mais contribuiu, principalmente, para os gestores dos órgãos públicos que estavam presentes de que de fato estas pequenas ações, que chamam de piloto, de amostra de produtor farol, unidade demonstrativa, como isso hoje é o pilar, o alicerce para você justificar a construção de uma política pública específica para o Semiárido. A seca veio, trouxe tantos prejuízos, mas as pessoas que desenvolvem esta proposta sofreram bem menos, quase não tiveram riscos por conta da apropriação da ideia de Convivência com o Semiárido. Imagine aí, a gente andou em comunidade neste mês e tudo seco, sem água e a comunidade produzindo queijo, manteiga de leite de cabra. É um tapa de luva nessa discussão do “combate à seca”, que tem que dá cesta básica, que tem que aposentar o pessoal, que tem que dá as medidas compensatórias. Mas de fato, a gente percebeu que a população está aprendendo a reconhecer o valor do Semiárido, quanta água a gente tem, o valor dos recursos naturais. E o grande limitante hoje é a questão fundiária. Se isso é resolvido as pessoas por si própria começam a resolver as suas atividades. Ao contrário você pode criar quantas tecnologias quiser, quantos programas quiser, se não for resolvida a questão fundiária tudo isso não vai dar certo, porque é uma questão técnica. Não consigo criar 100 animais, cabras ou ovelhas, em uma área de 10 hectares. É impossível tecnicamente você conciliar essa atividade com esse tamanho de propriedade. Acho que esse foi o grande mote da discussão, o Semiárido é viável, a Caatinga é rica, o problema está na questão fundiária.

Irpaa – Com quem foi discutido durante a Rota?

Moacir - Muito interessante porque tinham movimentos sociais, organizações de apoio a movimentos sociais, as ONG’s, grupos de agricultores e produtores, cooperativas, associações, pesquisa oficial e órgão da extensão rural, como a EBDA, Emater, além do pessoal e as secretarias estaduais ligadas a questão fundiária. Então, foi um conjunto de atores que direta ou indiretamente estão todos vinculados, mas que até então estávamos em espaços distantes uns dos outros cada um tentando resolver suas questões. E nessa Rota tivemos a possibilidade de discutir juntos lá na comunidade, na casa da família e tal, e perceber o que pensa o Estado, o que pensa a sociedade, onde se encontram, onde se confrontam. Então, também foi um momento de iniciar um diálogo entre esses vários atores daqui do Semiárido.

Irpaa – Desse diálogo gerou algum fruto?

Moacir – A conclusão da Rota foi a gente elaborar um plano de gestão do conhecimento. Isso consiste em elaborar atividades conjuntas para implementar e difundir conhecimentos em cada instituição, o que já detém [de conhecimento] e que foram apreendidos durante a Rota. Então, por Território ou por proximidade, as várias entidades fizeram planejamentos comuns para atuar daqui pra frente com o apoio do Programa Semear, mas muito neste sentido de concretizar algumas ações. Por exemplo, essa questão da terra, as entidades não têm o poder político de resolver o reordenamento fundiário, mas tem o poder de divulgar essa nova informação, de que a pobreza no Semiárido não é por conta do clima, é por conta do tamanho da propriedade. E a partir daí você vai criando a massa política para no futuro próximo reivindicar o reordenamento de fato apropriado à questão do Semiárido. Outra foi a questão da vigilância sanitária, que para a pecuária, principalmente, é muito opressora, no sentido de que toda legislação sanitária foi pensada em grandes unidades de produção e processamento ligados ao agronegócio, e o tamanho dos empreendimentos da agricultura familiar não são compatíveis à legislação. Então, a legislação não apóia, não cobre os empreendimentos familiares, que são tidos como clandestinos, inapropriados. Então, se criou também esta sensibilidade entre os gestores públicos que estavam lá, no sentido de lutar para criar, junto com a Economia da Caatinga, também essa legislação sanitária, que garanta a qualidade e a segurança do produto, mas dentro do contexto, das condições da agricultura familiar, principalmente, se envolve mais a questão da arquitetura, da infra-estutura de prédios, fábricas, abatedouros, matadouros, lacticínios que sejam compatíveis com o tamanho das unidades familiares, regionais e municipais.

Irpaa – Planos que foram elaborados partem da própria experiência das instituições ... como se deu a construção do plano e se esse plano traz um valorização do saber popular?

Moacir – Na elaboração dos planos tiveram vários aspectos. Por exemplo, por Território. O Irpaa se juntou com outras entidades e organizações daqui do Território [Sertão do São Francisco] e planejou ações mais específicas daqui que foi muito mais referente a caprinocultura, principalmente a caprinocultura de leite, armazenamento de forragem e a articulação junto ao [Colegiado] Território Sertão do São Francisco. Com a Embrapa a gente está planejando a realização do Semiárido Show, que também é um tipo de rota que o Semear pode apoiar. A COFASPI de Jacobina... a gente foi convidado a participar também na ajuda de desenvolver um processo de sistematização e elaboração de material didático, junto ao trabalho com os jovens que eles tem lá. Então, nesse caso aqui é de pegar o que as entidades estão desenvolvendo, sistematizar isto e devolver em forma de material didático, que possa ser usado pela comunidade e em outras comunidades também. Com a Emater do Ceará, eles têm o interesse de discutir de que forma utilizar o material didático que o Irpaa já dispõe. Então, a gente dialogou com vários grupos que estavam presentes e tantos locais que a gente tem acesso diretamente como outros mais distantes. Cada projeto elaborado foi muito nesse sentido, o que a gente já discutiu nessa rota, o que cada entidade já trazia e que desafios a gente percebeu nessa caminhada. Por exemplo, gestão das associações, a gente passou em algumas comunidades que as associações passam de pai para filho. A discussão é até que ponto isso é legal para médio e longo prazo. Até que ponto isso se torna ante democrático. Tinham várias situações que eram interessantes sim e outras era um problema. Então, a gente foi percebendo e avaliando, e as organizações que eu participo, que atuo, que eu assessoro, como é que elas estão? A outra da mão-de-obra familiar, uma questão interessante. Depois de tanta tecnologia você tem a família que já não comporta a mão de obra necessária para desenvolver aquelas atividades todas. Como que as pequenas máquinas entram para auxiliar a agricultura familiar hoje? São aprendizados e desafios que nós hoje não sabemos como responder, mas nos propomos buscar, contribuir com as respostas para estes desafios.

Irpaa – A Rota vem para reforçar a ideia da cultura do estoque e da Caatinga em pé? E mesmo que se tenha terra é preciso ter e manter a Caatinga em pé?

Moacir – Essa história do estoque é muito interessante, sabe? O capim morreu, a palma bem fraquinha, a quantidade que tinha não era suficiente, a leucena só aquela que tinha irrigada com o poço. Então se fosse depender dos pastos exóticos, trazidos de fora, não tinha nada. Mas todas as comunidades que a gente andou, as pessoas já tinham os armazéns mesmos, a casa de ração cheia com os sacos e fardos de plantas da Caatinga. Então, por conta própria tirando e secando. Um ou outro tem um triturador, uma forrageira. Mas a comida armazenada que tem nas comunidades é proveniente das plantas da Caatinga. O estoque ótimo, mas proveniente da Caatinga. Esse foi outro aprendizado que vai contribuir muito para as entidades de Assistência técnica e elaboração de projetos na hora de pensar a dinâmica da propriedade e da comunidade.

Irpaa – Quais foram os outros aprendizados ao longo destes oito dias de Rota, esses itinerários de visitas às experiências exitosas no Semiárido?

Moacir – Como o Irpaa está nesta proposta de implementação política de Convivência com o Semiárido, o nosso foco é buscar parceiros para defender essa proposta. E foi muito gratificante perceber como as pessoas das instituições públicas estão sensíveis e militantes nessa causa. Então, foi uma convivência muito interessante. Tinham alguns conflitos de faz ou não faz, que o governo não quer fazer, não pode fazer. Mas as pessoas que estavam na rota representando aquelas instituições, não são de primeiro escalão com a caneta na mão, mas são pessoas que, direta ou indiretamente, vão influenciar aqueles órgãos. Acho que isso foi para nós um avanço de buscar mais parceiros e também serviu um pouco para retirar aquele ranço, aquele preconceito, aquela concepção pré-concebida que com o Estado não tem diálogo. Então, saímos da rota muito animados com a disposição que estas entidades estatais tem relação com a Política de Convivência com o Semiárido.

Irpaa – Como o Irpaa avalia a Rota de Aprendizagem?

Moacir – Tudo isso que falei positivamente. Uma coisa que faltou, que a gente discutiu na avaliação, provavelmente, na terceira Rota vai está presente, que é a participação da escola pública. Discutiu muito o mercado, produção, técnica, organização da comunidade, mas a educação, que é o elemento que permeia todos esses canais, não esteve presente em nenhum momento e nem tão pouco a gente perguntou: e a escola contribui, trabalha, atrapalha? É um ator muitíssimo importante que na próxima Rota vai fazer parte tanto a visita às experiências educacionais de Convivência com o Semiárido como também a presença de gestores, professores, alunos na Rota. Uma coisa muito positiva e preocupante que a gente percebeu é que todas as comunidades que a gente visitou, as organizações tinham como base na organização a atividade da igreja católica de duas décadas atrás, na ideia das comunidades eclesiais de base, então, esse foi o lastro para todas as organizações que a gente conheceu. E a preocupação é que hoje a igreja católica não tem mais estes serviços. Tem outra linha, outra discussão. Quem vai fazer esta formação então? Uma das preocupações na Rota foi como a gente desenvolver mecanismo para criar uma estratégia de formação política dos jovens de hoje para serem os futuros gestores e produtores amanhã. Os que estão hoje contribuindo passaram por esta formação quando jovens, nos grupos de jovens, nas catequeses. E os jovens de hoje estão órfão dessa assessoria. Não se tem uma resposta pronta, mas cada grupo que se reuniu colocou como estratégias começar ou intensificar a atuação junto aos jovens porque percebemos como foi importante aquela formação de quando éramos jovens 15 a 20 anos atrás.

Irpaa – Vai ser uma demanda abraçada por estas instituições?

Moacir – No Irpaa a gente vem discutindo isto de forma não muito sistemática, mas que de fato é o momento de botar isso à tona e trabalhar com muito afinco. Porque o tempo passa, se não você vai ter uma geração desconectada da necessidade da realidade. É urgente a construção dessa estratégia de formação política dos jovens.

Irpaa – Qual a dimensão que a gente tem concreta da proposta de Convivência com o Semiárido neste contexto que estamos vivendo de longa estiagem, a partir das visitas?

Moacir - Independente da estiagem, nós somos a região que mais recebe bolsa família. Então, a nossa pobreza mais uma vez se prova que não é por conta do clima, mas toda essa conjuntura política e econômica que vem se fazendo. Uma das discussões que a gente tinha durante a Rota era observar a qualidade de vida das pessoas que a gente estava visitando. Isso quer dizer, como ela se posiciona na fala, se tem um discurso formado, se tem uma ideologia. O aspecto econômico, se já tem a casa de alvenaria, se tem os bens de consumo necessários. E na maioria a gente percebeu que sim, que as famílias têm uma melhoria bastante elevada na qualidade de vida. Imagina quando a gente começou a trabalhar no Irpaa vinte anos atrás, então numa época como esta, era uma seca até menor, mas no segundo semestre a gente não conseguia ir para as comunidades, até o padre cancelava as missas porque as comunidades não podiam receber as pessoas. Que não tinham nem água. Muito menos alimentos para fornecer às pessoas que iam se juntar ali. E essa Rota não. A gente percebeu que em cada lugar o pessoal estava vestindo camisa, festa do licuri, festa do umbu, festa do bode. Mesmo tendo a seca, as pessoas festejam a produção que tiveram. É uma contradição, quando está tudo seco festejar o que? O que conseguiu colher? Coisas da Caatinga. Tudo que se discutia se tem alguma coisa dando certo, tinha uma forte ligação com a Caatinga em pé. Em cada lugar que a gente foi tinha estas festas, a comunidade com muito alimento, produzido localmente, se não naquela comunidade, na comunidade vizinha. Almoçamos, lanchamos, jantamos nas comunidades, festas, tudo isso. Tudo com recursos locais. Não tinha produto vindo de fora ou tinha que comprar para trazer. Disponibilidade hídrica boa, as cisternas com água, tanque de pedra com água, poço com bomba manual com água. Claro que são comunidades estratégicas, onde tem uma atuação longa e sistemática das organizações de apoio, mas isso mostra que funciona. Não é uma política pública, são recursos limitados, mas conseguimos de fato, aquela família, aquela comunidade com esse pouco recurso, essa formação, desenvolver uma estratégia de convivência, apesar da seca eles passaram relativamente bem. E a outra questão foi a gestão. Então, essas três experiências que a gente visitou de fato eram gestadas pelas famílias mesmo, não tinha um assessor externo, alguém que fala pela comunidade, pela experiência. Eles mesmos, nos depoimentos, até contribuíram muito no sentido para readequar o projeto que a entidade levava e não considerava a época da chuva, a direção do vento, então tudo isso foi sendo readequado. Então, tudo isso nos deixou muito contente porque as pessoas estão de fato se empoderando (não vou receber qualquer coisa porque é de graça, do governo), mas tinha consciência do que queriam e como queriam. Isso mostrou que tendo formação boa é possível sim uma pessoa, uma família, uma comunidade, uma associação, uma cooperativa executar recurso público por conta própria e fazer um bom trabalho sem precisar ser tutelado toda uma vida por um organismo externo. Isso foi uma contribuição muito grande, e isso em um ano de seca. Se a gente vai no ano de La niña com chuvas acima da média, então você teria uma condição bem melhor, mas poderíamos dizer a desculpa que era porque tinha chovido. Então, esse momento foi estratégico na época mais seca do ano porque você percebe de fato o que sobra na época mais difícil. Porque andar na época da chuva é fácil tudo produz, tudo rende. Nesse momento foi muito estratégico. Então, acho que as famílias mostraram isso, se a gente tem assistência técnica adequada, se a gente tem a propriedade no tamanho suficiente, se a gente tem o nosso espaço para articulação e discussão interna, o Semiárido se torna muito viável, produtor de alimentos, de renda, de divisas internacionais como qualquer outra região do país.
 


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