IRPAA - Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada

Viver no sertão é conviver com o Clima

Formulário de Busca


Notícias

Asa, universidades e institutos de pesquisa avaliam potencialidades e riscos de tecnologias de saneamento básico rural com reúso de água no Semiárido

Asa, universidades e institutos de pesquisa avaliam potencialidades e riscos de tecnologias de saneamento básico rural com reúso de água no Semiárido

Realizado entre os dias 16 e 17 de maio, em Campina Grande-PB, o “Seminário Técnico Científico sobre Saneamento Rural com Tecnologias Sociais de Reuso de Água”, organizado pela ASA, trouxe os resultados de uma série de experimentos com reúso de água colocados em prática no Semiárido brasileiro nos últimos anos. O evento faz parte da construção de um programa próprio de saneamento rural com reúso de água enquanto uma política pública fundamental e teve como foco a análise da eficiência e do risco das tecnologias de saneamento.

Para Alexandre Pessoa, engenheiro sanitarista da Fiocruz, “não existe saneamento rural, desvinculado da produção agrícola”. Nesse sentido, Herica Cavalcante, professora da UFRN, defendeu que, em regiões com recursos hídricos escassos como o Semiárido, o esgoto pode ser um recurso hídrico alternativo e pode potencializar a agricultura. E de fato é nesta direção que as experiências desenvolvidas pela ASA têm apontado.

O professor Genivaldo Barros, da UFRPE, por exemplo, trouxe os resultados da experiência de reaproveitamento de águas cinzas em agroflorestas no Sertão do Pajeú e do Araripe, em Pernambuco. A pesquisa foi desenvolvida em parceria com o Centro Sabiá e o Caatinga e explora a quantidade e a qualidade da água cinza produzida, seus impactos sobre a produção de biomassa e sobre os solos irrigados.

 

Fossas digestoras como alternativa de saneamento

Para além do reúso de águas cinzas, as águas de esgoto total também podem ser tratadas. As fossas biodigestoras são uma das tecnologias utilizadas para este fim. A tecnologia é bastante disseminada devido ao seu baixo custo (R$ 3 mil) e tem tido uma boa aceitação nas comunidades rurais de Lajes Pintadas-RN, que atualmente, contam com 70 sistemas implantados, muitos deles fruto de replicação.

A UFRN, em parceria com a SEAPAC tem acompanhado a implantação e o controle da qualidade da água de esgoto tratada nesta região. O sistema implantado, chamado “Saneamento Fértil”, trata os efluentes do esgoto, permitindo reaproveitá-los na agricultura. Como resultado, a investigação identificou um aumento na produção agrícola e uma maior oferta alimentícia para os moradores e animais após a implantação do sistema.

 

Biogás a partir do esgoto?

A biodigestão é um processo complexo em que um consórcio de microrganismos degradam uma matéria orgânica e geram alguns produtos aproveitáveis. Um deles é o biogás, que no meio rural pode ser utilizado como substituto do gás de cozinha, outro é o biofertilizante, que pode ser utilizado para irrigar a agricultura, explica a bióloga e engenheira química da UFPE, Daniela Gomes.

Os biodigestores já vêm implantados por organizações que fazem parte da ASA, mas funcionam a partir de esterco animal e água. Uma pesquisa, ainda em andamento, da UFPE em parceria com a Diaconia, está testando a possibilidade de produzir um biogás a partir do tratamento de águas residuais, incluindo as fecais. Assim, além de ser uma alternativa para o saneamento rural, ele seria uma alternativa sustentável de geração de energia.

Daniela Gomes, autora do estudo e pesquisadora do PROTEN-DEN/UFPE, diz que os resultados preliminares são animadores, mas que a experiência ainda precisa ser replicada em escalas maiores e testada a partir de diferentes interferências externas.

 

Qualidade da água do reúso

Durante o seminário, várias análises de qualidade da água foram apresentadas, assim como a média de volume de água reutilizada por família contemplada com os sistemas, na ordem de 50 mil litros de água por ano, o equivalente a uma cisterna de produção.

No geral, há um consenso entre os pesquisadores que os resultados apontam potencial na remoção de matéria orgânica e de microrganismos, bem como na preservação de nutrientes de interesse às plantas. Entretanto, o monitoramento também indica que é necessário o comprometimento das famílias para a manutenção e manejo correto das tecnologias, e uma assessoria contínua para animação desse processo, sob risco de falhas no tratamento.

“Não precisamos nos desanimar diante riscos decorrentes do manejo, porque eles não são distintos daqueles decorrente do manejo da água de beber, e do preparo de alimentos, mas, manter a mesma atenção em relação ao aprimoramento das tecnologias, à apropriação das práticas de manejo requeridas pelas mesmas e das práticas de proteção e higiene pessoal, explica, André Rocha, colaborador do Irpaa que apresentou resultados de pesquisas realizadas em parceria com a Univasf, comparando a qualidade da água do esgoto bruto com a do efluente tratado com várias tecnologias.

Herika Cavalcante, assim como outros colegas presentes no Seminário, chama atenção para o fato de que o monitoramento da qualidade da água produto do reúso ainda precisa ser expandido e melhorado. Também há necessidade de se discutir a padronização de alguns índices de qualidade da água.

 

Outras experiências

No segundo dia de evento, foram realizadas duas visitas a experiências de reúso de água, vivenciadas por famílias agricultoras do Quilombo Santa Rosa, no município de Boa Vista-PB. A comunidade é acompanhada pelo Coletivo Regional das Organizações da Agricultura Familiar do Cariri, Seridó e Curimataú, território onde atua a entidade de assessoria sócio-organizativa Patac, que também faz parte da rede ASA.

As experiências fazem parte da pesquisa participativa que está sendo realizada em parceria com a WTT, a Universidade Federal Regional de Pernambuco (UFRPE) e o Instituto Nacional do Semiárido (INSA).

O primeiro sistema visitado foi o da agricultora, Justina Maria Celestino Marques. Esse sistema possui uma lagoa de polimento elevada, onde a água da louça e do banho passa por processo de filtragem da gordura, repousa três dias na lagoa, em exposição ao Sol, para, em seguida, ir para irrigação de fruteiras e forrageiras.

O segundo sistema foi o da agricultora, Eliane Santos da Silva, caracterizado por um filtro anaeróbio onde o trabalho de desinfecção é feito por bactérias, esse protótipo trabalha a filtragem da água de baixo para cima. Esse modelo é adequado para famílias de até 10 pessoas.

A pesquisa busca analisar a eficiência das tecnologias para a purificação das águas cinzas, considerando o perfil socioeconômico das famílias participantes, o manejo adequado, o tempo de trabalho dedicado a limpeza dos filtros, o impacto do armazenamento dessa água para o Semiárido, a divisão sexual do trabalho doméstico no agroecossistema. Tudo isso, com o objetivo maior de armazenar uma água que seria desperdiçada, torná-la adequada para a produção de alimentos, inclusive hortaliças, o que se torna uma estratégia de enfrentamento à fome. É importante observar que o aumento da investigação, através da implantação de mais sistemas, poderá trazer maiores resultados e incentivar a criação de uma política pública com baixo índice de contaminação.

Para a agricultora Eliane, o sistema de reúso tem mais avanços que desafios, no tocante ao armazenamento e no fortalecimento da produção de alimento humano e animal no quintal de casa. Ela considera que: “O reúso é bom porque antes dele, eu desperdiçava a água, agora, a água vai para as plantas, o que aumentou a produção no meu quintal”. Nesse ano de 2023, a família já conseguiu armazenar 25 mil litros de água residuária, o que equivale a quase 50% do armazenamento realizado pela Cisterna Calçadão da propriedade, impactando diretamente o aumento da produção.

Em relação aos desafios, a pesquisa aponta: O abandono do sistema por falta de tempo para limpar os filtros, retorno da água para dentro de casa (entupimento), o tempo de vida do filtro que depende da limpeza e a sobrecarga de trabalho para as mulheres.

A visita foi encerrada com um debate sobre a importância dos sistemas de reúso testados na comunidade, a viabilidade de cada um para a realidade das famílias e de como a tecnologia mudou a realidade dos quintais no aspecto positivo de armazenamento da água que seria desperdiçada.

Os dois sistemas estão sendo monitorados há 8 meses e deverão rechear os dados para que as instituições cheguem a um protótipo que melhor se adéqüe a realidade do Semiárido brasileiro, o que implicará na construção de uma política pública de saneamento rural com o uso dessa tecnologia.

 

Por uma política de saneamento rural

As experimentações com reúso de águas ganharam escala nos últimos 10 anos, e para a ASA, desde 2016, a pauta tem ganhado espaço. Em 2022, a articulação publicou uma carta política em que estabelece como meta implementar 200 mil cisternas de coleta e tratamento de esgoto e reúso de águas, avançando em uma política de saneamento rural pautada como uma das prioridades para os próximos anos.

“A experiência da ASA demonstra que ampliar a oferta de águas para usos múltiplos (banho, lavar roupa, lavar louça, etc.), também amplia a produção de alimentos saudáveis pelos/as agricultores/as, através da reutilização dessas águas nos sistemas produtivos e agroecológicos e na recuperação de áreas degradadas. É fundamental implementá-lo com significativa participação popular”, afirma o documento.

No mesmo ano, a ASA realizou o Seminário Saneamento Rural em Recife e deu início a experimentações com reúso de água nos estados do Semiárido brasileiro desde a perspectiva de que é preciso utilizar e reutilizar as águas totais das casas.

O “Seminário Técnico Científico sobre Saneamento Rural com Tecnologias Sociais de Reuso de Água” é o momento de avaliação dos resultados destas experimentações e consolidação de uma proposta de política pública de saneamento rural para o Semiárido.

Texto: Eixo Educação e Comunicação do Irpaa, ASA-PB, Asacom
Fotos: Eixo Educação e Comunicação do Irpaa
 


Veja também

< voltar    < principal    < outras notícias

Página:

Asa, universidades e institutos de pesquisa avaliam potencialidades e riscos de tecnologias de saneamento básico rural com reúso de água no Semiárido

Para:


Suas informações:



(500 caracteres no máximo) * Preenchimento obrigatório




Campanhas

Newsletters

Cadastre seu e-mail para receber notícias.

Formulário de Contato





Faça sua doação


Copyright © 2005 - 2009 IRPAA.ORG Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada - IRPAA
Avenida das Nações nº 04 - 48905-531 Juazeiro - Bahia, Brasil
Tel.: 0055-74-3611-6481 - Fax.: 0055-74-3611-5385 - E-mail: irpaa@irpaa.org - CNPJ 63.094.346/0001-16
Utilidade Pública Federal, Portaria 1531/06 - DOU 15/09/2006 Utilidade Pública Estadual, Lei nº7429/99
Utilidade Pública Municipal, Lei nº 1,383/94 Registro no CNAS nº R040/2005 - DOU 22/03/2005