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Audiência Pública para discutir implantação de complexo eólico em Canudos evidencia desrespeito às leis e Comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto

Audiência Pública para discutir implantação de complexo eólico em Canudos evidencia desrespeito às leis e Comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto

O município de Canudos-BA já possui 28 aerogeradores em operação pela empresa Voltalia do Brasil, implantados sem a realização de Consulta Prévia à comunidade tradicional de Fundo de Pasto Bom Jardim. Nesta quarta-feira (11), foi realizada a Audiência Pública sobre o Complexo eólico de Canudos, que tem a pretensão de implementar mais 325 aerogeradores.

Durante a Audiência foi dada grande visibilidade à empresa Voltalia, um empreendimento internacional que visa, exclusivamente, o capital financeiro, com o falso discurso da energia renovável limpa. Mas, limpa para quem?

No Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), foi indicado que a área de influência direta e indireta do empreendimento atinge 11 comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto certificadas pelo Estado da Bahia, portanto, possuem direitos próprios resguardados no ordenamento jurídico, incluindo o direito à consulta e consentimento prévio, livre e informado.

Vale ressaltar que a comunidade Bom Jardim está construindo o Protocolo Autônomo de Consulta e Consentimento prévios, a partir da Convenção nº. 169, da OIT e do Decreto n°. 10.088/2019, que consolida os “atos normativos editados pelo Poder Executivo federal que dispõem sobre a promulgação de convenções e recomendações da Organização Internacional do Trabalho - OIT ratificadas pela República Federativa do Brasil”.

A RIMA desconsidera completamente a tradicionalidade das comunidades de Fundo de Pasto. Inclusive, nas fases de implantação do projeto, está previsto como uma das obras do empreendimento a “limpeza dos terrenos (retirada de vegetação)”, ou seja, a empresa Voltalia trata a Caatinga, único bioma exclusivamente brasileiro, que precisa ser conservado, como um lixo, pois geralmente a gente limpa o que está sujo, retira o que não tem finalidade.

Nesse contexto, é importante destacar alguns dados publicados pela rede colaborativa MapBiomas, que alertaram sobre o crescimento do desmatamento na Caatinga. “Mais de um quinto (22%) dos alertas validados em todo o Brasil em 2023 foram na Caatinga, que respondeu por 11% da área desmatada no Brasil no ano passado. Foram 201.687 hectares – um aumento de 43,3% em relação a 2022”. O relatório aponta ainda que “houve registro de pelo menos um evento de desmatamento em 1.047 (87%) dos 1.209 municípios que compõem o bioma Caatinga em 2023. Mais de 4.302 hectares foram desmatados por empreendimentos de energia renováveis (eólica e solar)”. Portanto, de acordo com o alerta, esses empreendimentos ditos sustentáveis, desmataram, apenas em 2023, aproximadamente 43 Km² de Caatinga, o equivalente a uma média de 6 mil campos de futebol. Outro dado, desse mesmo alerta do MapBiomas, é que, na Caatinga, a “Bahia lidera o desmatamento, com 93.437 hectares – um aumento de 34% em relação a 2022”.

O relatório da empresa apresentado na audiência também prevê a abertura e melhoria das estradas e acessos de serviço, para favorecer o transporte dos componentes das turbinas e acesso dos guindastes, serviços de terraplanagem e construção civil. Então, a empresa usa dessa falta de direito das comunidades a estradas boas para convencer, com o discurso de que é melhoria. No entanto, está focada apenas no trabalho de construção das torres e que gera diversos prejuízos às famílias rurais, pois são caminhões pesando toneladas que destroem as estradas e levantam muita poeira, que afeta diretamente a vida e a saúde das pessoas.

A Voltalia promete a contratação de mão de obra a partir dos municípios de Canudos e Jeremoabo; mas, que tipo de trabalho é esse? Quanto tempo vai durar? Trabalho precarizado, com salários baixos e com prazo de encerrar, pois a fase de construção dura 24 meses. Depois as pessoas das comunidades estarão desempregadas, tendo como “lucro” apenas os impactos negativos dessa empreitada, como destruição da fauna e flora da Caatinga e enfermidades.

A RIMA nega totalmente todos os impactos gerados na saúde das pessoas, fatos já registrados em vários estudos, como depressão, ansiedade, surdez, dentre outras.

Outro ponto interessante para destacar, da audiência, aconteceu durante a apresentação da empresa Voltalia, foi quando a diretora da parte fundiária e relacionamento com comunidades na empresa, Ariana Victorino Machado, ressaltou: “Eu fico responsável pela regularização fundiária das comunidades”. A partir dessa afirmação, é preciso questionar: desde quando uma empresa privada é responsável pelo regulamento fundiário das comunidades?

O líder comunitário de Bom Jardim, Luis Carlos, questionou porque o Inema não realizou a consulta prévia, livre e informada, que não aconteceu antes das instalações das 28 torres, em 2021, na comunidade. Diante do não comprimento dessa Convenção da OIT, o Inema simplesmente não respondeu ao questionamento.

O papel do Inema deveria ser, como instituído, uma espécie de guardião da Política Estadual de Meio Ambiente e de proteção à biodiversidade, por exemplo; além de exercer a função de fiscalizar as atividades que possam degradar a qualidade do meio ambiente. No entanto, a Audiência Pública “convocada” pelo Instituto deixa a desejar em relação ao comprometimento com essa ação, se colocando muito mais como uma “despachante” da Voltalia, como destacou em sua fala o professor Adalton Marques, da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), que questionou a posição do Inema nessa condução.

Uma reflexão marcante na audiência foi feita pelo integrante da Articulação Estadual das Comunidades Tradicionais de Fundos e Fecho de Pasto, Valdivino Rodrigues; ele relatou que os grandes empreendimentos chegam e não respeitam os modos de vida e organização, dividem as comunidades, criando um clima de tensão em um espaço que tem como princípio a coletividade.

Os grandes empreendimentos focados única e exclusivamente no capital gerado por esse modelo de transição energética centralizado não se preocupam em respeitar leis, territórios e modos de vida tradicionais, Caatinga ou a qualidade de vida das pessoas. É preciso que a população e as comunidades reflitam criticamente sobre essas verdadeiras invasões e cobrem dos órgãos públicos e gestões dos governos, para que atendam aos interesses da população e não de uma empresa privada; além de atuarem com responsabilidade e transparência nos processos.

Texto e fotos: Eixo Educação e Comunicação do Irpaa


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