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O futuro das comunidades quilombolas está em perigo

O futuro das comunidades quilombolas está em perigo

“O território para as comunidades quilombolas é a base, o firmamento, é o chão. Poderia uma árvore crescer, ter tronco, ter galhos, dar bons frutos e flores sem que antes tivesse raiz? Não, né? Então da mesma forma é o território para os povos quilombolas”, diz Mendes, de Conceição das Crioulas, uma das primeiras comunidades quilombolas a receber a titulação em Pernambuco e no Brasil. Segundo ela, a identidade negra sempre foi marcante na comunidade e o reconhecimento ao seu território, no ano de 2000, veio afirmar ainda mais a história de luta e resistência dos seus antepassados.

A conquista da terra trouxe autonomia e dignidade aos quilombolas de Conceição das Crioulas. Hoje, além da roça, eles possuem creches, casas populares, acesso à água e podem ter acesso livre aos bens naturais de todo o território, a exemplo do barro, que é usado para fazer artesanato e antes ficava dentro da área que pertencia aos fazendeiros. “As fazendas sendo indenizadas, sendo desintrusadas, que é o processo de saída dos fazendeiros da terra, a comunidade passou a sentir de fato o gosto da liberdade porque regularização fundiária para nós representa a verdadeira liberdade, ela representa a verdadeira alforria”, ressalta Fabiana.

O direito ao território e a identidade de Fabiana, e de todos os quilombolas do país, estão seriamente ameaçados pela Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 3239/2004 que questiona o direito de propriedade das comunidades quilombolas regulamentado pelo Decreto nº 4887/2003. A ação foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo antigo Partido da Frente Liberal (PFL), atual Partido Democratas (DEM), e será julgada no próximo dia 16 de agosto.

O decreto 4887/2003 é o instrumento legal que reconhece, na prática, o direito dos quilombolas ao seu território assegurado pela Constituição Federal de 1988, através do art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Através deste decreto, compete ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos quilombolas.

“Nosso povo mais velho construiu o decreto 4487. É um decreto feito por nós e para nós. Tem algo mais constitucional do que isso? A constitucionalidade de qualquer lei ou decreto deveria partir do princípio da utilidade, do quão útil é tal lei/decreto na vida das pessoas que precisam, na vida daqueles que são beneficiados. Eu como quilombola digo que o decreto é fundamental, é extremamente necessário que ele continue existindo. Ele é legitimo”, defende Fabiana que vai acompanhar a votação em Brasília-DF, juntamente a outros quilombolas.

A resistência dos quilombolas se dá em várias frentes, seja na luta pela titulação cotidiana dos territórios quilombolas junto ao Incra, pela presença dos quilombolas no dia do julgamento e nas reuniões com os ministros do Supremo, como também por meio de petições pedindo pela permanência dos direitos dos quilombolas.

A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) em parceria com outras organizações da sociedade civil lançaram uma petição online pedindo que o Supremo Tribunal Federal (STF) mantenha a titulação de territórios quilombolas no Brasil. A ação faz parte da campanha “O Brasil é Quilombola! Nenhum quilombo a menos!”. Para assinar a petição clique aqui.

Fernando Prioste, da ONG Terra de Direitos, explica que desde que a ação foi ajuizada,  em 2004, as comunidades quilombolas têm lutado para que ela não seja reconhecida. “Para além da ação que corre na justiça, é fundamental que seja feita pressão para que os territórios quilombolas sejam titulados. Até hoje, o Incra titulou apenas 37 comunidades quilombolas de mais de 1600 que têm seus pedidos em aberto. Com isso, o Incra vai demorar aproximadamente 600 anos pra titular todos os territórios”, denuncia.

O processo

De 2004 para cá houve um julgamento, em 2012, com o voto do ministro Cezar Peluzo que foi contra o direito dos quilombolas. Na ocasião, a ministra Rosa Weber pediu tempo para estudar o processo e apresentou voto favorável aos quilombolas em 2015. Com essa decisão, o julgamento está empatado em 1x1. Nesse mesmo dia, o ministro Dias Toffoli pediu mais tempo para apresentar seu voto, que será anunciado no dia 16 e agosto. Ou seja, outro ministro pode fazer o mesmo e o julgamento pode se estender por mais tempo.

No caso de uma decisão desfavorável aos quilombolas, Prioste explica que é necessário fazer uma análise cautelosa da decisão do STF e a partir daí pensar as ações que podem ser tomadas do ponto de vista jurídico. “A gente espera que o STF tome o tempo que for necessário pra fazer um julgamento maduro, conhecendo bem a matéria, para que seja um julgamento justo para as comunidades quilombolas. Mas, se por um acaso, o Supremo der uma decisão que vá contra o direito das comunidades quilombolas, não é o fim dessa história. A luta com certeza vai continuar porque essa luta é centenária, que já passou por vários desafios, inclusive judicias, e vai seguir em frente”.


Os casos de Acauã e Paiol da Telha

Em nível estadual, o decreto nº 4887 também vem sendo questionado. No final do mês de junho, houve uma audiência na sede do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5), no Recife (PE), para julgar a constitucionalidade do decreto. O caso está vinculado à comunidade quilombola de Acauã, localizada no município de Poço Branco, no Rio Grande do Norte, e foi perpetrada por um latifundiário que questionou judicialmente a desapropriação de suas terras que estão no território da comunidade.

Na ocasião, os juízes pediram mais tempo para estudar o caso e até o momento não há uma nova data para o julgamento. A decisão definitiva do TRF5 atingirá não apenas Acauã, mas todas as comunidades quilombolas dos estados de Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará e, indiretamente, todas as comunidades quilombolas do país.

Outro ataque ao decreto quilombola ocorreu no Paraná, em 2013, quando latifundiários entraram com uma ação no Tribunal Regional Federal da 4ª Região para julgar a constitucionalidade do decreto envolvendo a comunidade quilombola do Paiol de Telha. O TRF4 declarou o decreto constitucional por 12 votos a 3. A decisão foi uma vitória do povo quilombola e fruto de intensa luta da comunidade do Paiol da Telha.

Texto- Gleciane Nogueira - Asacom / Foto: Ripper
 


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