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Editorial

A extinção massiva dos rios brasileiros

O fenômeno da Pororoca, mundialmente conhecido, já não existe mais. Você sabia disso? As águas do rio Araguari, no Amapá, já não têm forças para chegar à foz e sofrer a força reversa das águas, o que gerava as ondas. Construíram barragens em seu leito para gerar energia, que vem para o sul do país, além de pisotear suas margens com manadas de búfalos.

As águas do Araguaia estão cada vez mais escassas. Muitos de seus afluentes, antes perenes, agora também são intermitentes.

O São Francisco agora terá uma vazão de apenas 700 m3/s. Um rio que, segundo o discurso oficial do antigo governo federal, tinha uma vazão “firme” de 1800 m3/s a partir de Sobradinho. E olha que a Transposição sequer começou. Onde Domingos Montagner morreu, na verdade, o que existe é um fiapo de água, em comparação com o que era o Cânion do São Francisco.

O mais emblemático, sem dúvida, é o rio Doce. A tragédia da Samarco não tem precedentes em território nacional, mas está sendo tratada como algo secundário e como se fosse apenas um acidente de percurso.

Se falarmos, então, da qualidade de nossas águas, teremos que lembrar do Tietê e do Pinheiros, a cara, a cor e o cheiro do desenvolvimento de São Paulo.

O que acontece não é fruto apenas de como se trata as calhas principais de nossos rios, mas de todo o desmatamento do território dessas bacias. A destruição do Cerrado – reconhecimento rotineiro nos meios científicos e socioambientais – levará consigo os rios que dependem do Cerrado. Já em 2004 tínhamos a informação que, apenas no Norte de Minas, cerca de 1200 rios menores tinham sido eliminados. Sem o Cerrado, nos dizem os cientistas, não haverá São Francisco, Araguaia e tantos rios que dependem dos aquíferos do Planalto Central. A criação do MATOPIBA – território do agronegócio no Cerrado – levará às profundezas esse modelo predador do bioma.

A curva de decadência de nossos rios coincide exatamente com a expansão das monoculturas, seja de grãos, de gado, ou outra qualquer. É só comparar os gráficos a partir da década de 1970.

Assim, nesse dia de São Francisco, como os profetas dos tempos antigos, que amaldiçoavam o dia que tinham nascido, não nos cansamos de trazer más notícias, ainda que sejam em forma de denúncia (Jeremias 20,14-18).

Toda classe política, todo mundo econômico – exceções de sempre - está a alguns anos-luz distante de enxergar o país por esse ângulo. Então, prosseguimos em linha reta rumo ao abismo.

 

Autor(a): Roberto Malvezzi (Gogó)

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