Editorial
É preciso se levantar contra esta ideologia racista
O ex-governador Alberto Goldman, coordenador da campanha de Aécio Neves em São Paulo, no site do PSDB expôs: “O Brasil rejeitou o PT. Dilma não teria condições de governar o Brasil.”
Entre outras coisas, escreveu: “O Brasil do trabalho formal, produtivo, dos seus trabalhadores e empresários, no campo e na cidade, o Brasil da cultura e da tecnologia – essa é, de fato, a elite brasileira – rejeitou, por ampla maioria, o PT e sua candidata.”
Assustador esta afirmação. Trabalho formal? Criar caprinos e ovinos, produzir feijão e milho não é trabalho produtivo? Quer dizer o semiaridense passa o dia trabalhando, mas não produz nada? Não são trabalhadores? Grande ilusão do ex comunista, trabalho só existe na indústria dos empresários?
É incrível de ver, quantos empreendimentos produtivos surgiram depois da universalização do Luz para Todos, das cisternas de produção e de outros projetos produtivos no campo. Só vale latifundiário quem tem mais mais de 10.000 hectares? O Brasil da cultura? Isso realmente dói, é como se dissesse que o nosso povo não tem um pingo de cultura, são como jegues e cavalos (me perdoem os dois!). Só vale cultura importada dos Estados Unidos e Europa?
O Brasil da tecnologia? Seria interessante saber dele, o que entende de tecnologia.
Percebemos que a classe dominante brasileira está retomando a análise de sociedade de séculos atrás, como Francisco Adolfo Varnhagen, que escreveu entre 1854 e 1857 a primeira história do Brasil que se reflete até hoje na Historiagrafia oficial. Defendeu com força a suposta superioridade cultural e religiosa portuguesa. Contesta a contribuição dos povos indígenas na História do Brasil, são somente um pano de fundo, e classifica a escravidão como oportuna para civilizar os negros.
Nos remete também à “Guerra de Canudos” no sertão baiano entre 1896 e 1897, que terminou com a aniquilação da cidade de Canudos e matança dos seus habitantes. Euclides da Cunha acredita que a intensa miscigenação é a principal responsável pelo atraso e pelo fanatismo do sertanejo, na medida em que termina por produzir uma sub-raça.
E em tempos mais recentes encontramos a palavra “Untermensch” (subhumano em alemão) um termo da ideologia racista usada para descrever "povos inferiores", não enquadrados na raça ariana, de acordo com a terminologia racial nazista.
500 anos fizeram do Semiárido um campo de serventia para interesses externos. Logo no início do séculos 17, trouxeram o gado bovino para o sertão, não para beneficiar os seus moradores, mas os donos dos engenhos do litoral. Veio depois a extração do caruá, para fabricar cordas nos EUA e na Europa. A febre de fornecer algodão para Inglaterra durante a guerra de secessão nos EU, devastou o Sertão do Piaui, Ceará , de maneira irrecuperável, o sisal e muitos outros.
E mais recente conhecemos os mirabolantes projetos como “Projeto Nordeste”, “Padre Cícero”, “Chapeu de Couro” etc, que prometiam tudo e deram nada, ou, melhor, deixaram os agricultores endividados por décadas. Todos projetos elaborados nos gabinetes de Brasília, nas capitais nordestinas.
O que mais o povo precisava, era terra de tamanho apropriado para o Semiárido, e isso não constava nas planilhas. Apenas um desses projetos deu certo, mas já foi agora nos anos do Governo de Lula e Dilma. Um projeto, baseado na Convivência com o Semiárido, construído em torno da ASA, por muitas mãos e cabeças, cochichos e reuniões do povo do Semiárido. Ideias e propostas para leis, decretos e políticas públicas, levados por gente competente para ministérios, governos de Estados, para fóruns e conselhos. A sua realização conseguiu reverter a situação da fome, miséria e abandono. Mudou a vida, mudou para o melhor.
Passamos três anos de seca. Não foi fácil, mas, nada de calamidade, como em secas passadas. O povo estava preparado, o Governo reagiu com agilidade. Mas parece que estes do “trabalho formal, produtivo,... trabalhadores e empresários” enfim “a elite brasileira”, teriam preferido que novamente tivesse morrido quase um milhão de pessoas, como na seca de 1979 a 1983, ou talvez mais, diminuindo assim o número dos moradores dos grotões.
Juazeiro, 21 de outubro de 2014
Autor(a): Haroldo Schistek