“Como funciona a sociedade?" Apesar de complexa, foi na busca por tentar responder a essa pergunta que cerca de 30 jovens, de diferentes comunidades tradicionais, dos territórios do Sertão do São Francisco, Piemonte Norte do Itapicuru, Sisal e Itaparica se encontraram no Centro de Formação Dom José Rodrigues, em Juazeiro. Os jovens participaram do 4º Módulo do Curso de Formação Continuada de Jovens Lideranças para a Convivência com o Semiárido, que aconteceu entre os dias 27 e 29 de setembro.
Amplamente reconhecido pelos movimentos sociais, este momento formativo se concentra em desvendar a lógica capitalista da sociedade, entre outros aspectos fundamentais. Esta etapa, visou promover o conhecimento sobre a organização da sociedade brasileira, para fortalecer a atuação da juventude em associações comunitárias, sindicatos, movimento estudantil e demais setores engajados na luta por direitos. Dessa forma, o momento possibilitou aprofundar conceitos que auxiliam na compreensão da produção de riqueza e miséria no país, bem como das raízes da desigualdade social brasileira.
O módulo foi ministrado por Eduardo Mara, professor adjunto do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e membro da Consulta Popular. Com experiência em Ciências Sociais, Serviço Social, Ciência Política e Economia Política, Mara é especialista em formação social brasileira, movimentos sociais, sindicalismo, classes, clássicos da sociologia e Estado.
Lili Santos, jovem da comunidade Sítio Nova Jurema, em Campo Alegre de Lourdes-BA, destaca a importância do curso para sua compreensão da sociedade. “Eu senti diversas emoções. No começo, além da curiosidade em saber o que tinha, o que que acontece na sociedade. E assim que eu descobri, tive um choque de realidade na minha cabeça. Eu sabia que era ruim, mas eu não sabia que era tanto e que isso é uma realidade bem cruel (…) E é um sentimento também que, ao mesmo tempo que a gente sente dor e indignação, saber que a gente está estudando sobre isso e aprendendo e que podemos mudar, dá uma sensação muito boa e aconchegante. Eu nunca tinha frequentado nada do tipo”, declarou a jovem que vem acompanhando os debates desde o primeiro módulo.
Ela revela ainda como essa formação mudou sua forma de enxergar o mundo e marcou sua vida: “O pouco que eu sabia era o que eu via da internet e já tinha aberto mais a minha mente. Eu acho que esse talvez seja o que vai mais marcar a história desse curso, da minha vida, porque foi o que fez a gente… eu descobrir o mundo de verdade, abrir os olhos e enxergar ele de uma outra forma. Então, eu acredito que essa formação seja muito importante pra minha vida e o dia de hoje, esses dias que passamos estudando e aprendendo, eu quero levar pra minha comunidade".
Sentimento partilhado também por Chirlei Cavalcante, da comunidade Sítio Geraldo, em Pilão Arcado. A jovem observa que todos os módulos têm uma conexão muito forte entre os conteúdos e as vivências e afirma que a mensagem mais importante que leva para a sua comunidade é a união, a organização e o desejo de mudança. “A mensagem que eu carrego dentro da minha bagagem é de que nós, unidos e organizados, podemos mudar alguma coisa para nós e, principalmente, para as próximas gerações, como muitos já fizeram. Vim diversos exemplos do professor Eduardo Mara, através também dos módulos (anteriores) e intercâmbios”. E complementa afirmando que: “Como jovem liderança, mobilizada que se nós nos organizarmos enquanto jovem, mulher, enquanto povos de comunidades tradicionais, nós podemos ir além do que o sistema impõe. E que ser liderança é necessário, pois precisamos nos fortalecer e buscar fortalecer outras pessoas para caminharmos juntos. O mais importante é ninguém soltar a mão de ninguém”.
Durante esta etapa, o curso também dedicou um espaço para refletir sobre a importância das reuniões nas organizações. Mediado pelo colaborador do Irpaa, Paulo César, a partir do livro ‘Trabalho de Base’, de Ranulfo Peloso, e do texto de Ademar Bogo, os/as participantes puderam atualizar seus conhecimentos sobre as dinâmicas de grupo e as ferramentas sobre as melhores práticas para conduzir reuniões.
Ao longo dos três módulos anteriores, a turma refletiu sobre temas essenciais como: questões sobre racismo, gênero, diversidade, políticas públicas para as juventudes do Semiárido e direitos sociais; comunicação popular e educação contextualizada, buscando entender melhor o papel da mídia e da educação na formação de nossa sociedade e na construção da imagem do Semiárido, além da crítica da mídia e do combate às notícias falsas e desinformação.
A etapa realizada em Salvador, durante o Encontro Estadual do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), ampliou o horizonte dos participantes, que tiveram a oportunidade de compartilhar experiências com outras juventudes e aprofundar seus conhecimentos sobre as questões fundiárias e minerárias que afetam os territórios tradicionais da Bahia.
O Curso de Formação Continuada de Jovens Lideranças para Convivência com o Semiárido (CFJL), realizado pelo Irpaa, teve início em setembro de 2023 e segue com atividades formativas, dentro e fora das comunidades, até 2025, com as seguintes temáticas: Regimes político-econômicos da sociedade brasileira; Políticas públicas, orçamento participativo e práticas tradicionais de geração de renda e alimento e a economia solidária na perspectiva da Convivência com o Semiárido; e o papel dos movimentos sociais e do Estado.
Texto e fotos: Danilo Souza
Edição: Lorena Simas
Eixo Educação e Comunicação do Irpaa