O Semiárido Brasileiro tem inspirado iniciativas em várias partes do mundo, e mais uma vez foi o destino para uma troca de experiências que cruzou oceanos. Jovens profissionais da Somália vieram ao Brasil para vivenciar de perto a proposta de Convivência com o Semiárido, conhecer tecnologias de captação, armazenamento e reúdo de água de chuva e práticas de criação de caprinos que transformaram a vida de milhares de famílias.
Entre os dias 9 e 12 de setembro de 2025, o grupo esteve em Juazeiro (BA) para um intercâmbio organizado pelo Irpaa, em parceria com a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA). A iniciativa proporcionou uma imersão nos programas Um Milhão de Cisternas (P1MC) e Uma Terra e Duas Águas (P1+2), referências internacionais no enfrentamento dos desafios hídricos do semiárido, que substituem o antigo paradigma de “combate à seca” por soluções que promovem autonomia, produção de alimentos e fortalecimento comunitário.


Cinco jovens participaram do intercâmbio: Mohamed Mohamud Abdi, Mohamed Shukri Mursal, Miski Ahmed Mohamud, Jimale Abdi Hassan e Hani Ahmed Mohamud. Durante quatro dias, o grupo percorreu comunidades rurais e espaços de comercialização da agricultura familiar, conhecendo de perto como as tecnologias sociais são integradas à vida das famílias.
A programação começou com acolhida e visitas à cidade, incluindo o Armazém na Caatinga, onde são comercializados produtos da agricultura familiar. No segundo dia, os somalis participaram de uma apresentação institucional do Irpaa e de visitas pedagógicas ao Centro de Formação Dom José Rodrigues, onde viram de perto tecnologias sociais de captação e manejo de água, produção agroecológica, recuperação de áreas degradadas e uso agrícola de águas residuais.


Segundo André Rocha, coordenador do Eixo Clima e Água do Irpaa e um dos mediadores do encontro,
“O contato se deu a partir do Diretor da Associação de Captação de Água de Chuva da Somália (RAAS), que conhecendo a experiência brasileira via ABCMAC, pediu uma formação em 2024. Dessa vez, em 2025, com outra equipe, viabilizamos como intercâmbio. Tivemos explanações teóricas, visitas ao Centro de Formação Dom José Rodrigues e às comunidades de Massaroca e Cacimba do Silva. O foco foi a captação de água de chuva e a criação de caprinos, temas solicitados pelos próprios visitantes.”
O terceiro dia foi dedicado a visitas às comunidades rurais beneficiadas pelos programas P1MC e P1+2, onde os visitantes observaram cisternas em uso para consumo humano, produção de hortas e manejo de pequenos animais. Já o último dia levou o grupo a comunidades de Fundo e Fecho de Pasto, conhecendo modelos de criação de caprinos e ovinos adaptados ao bioma Caatinga.
Para os visitantes, a experiência foi transformadora. Miski Ahmed Mohamud, oficial de projetos da RAAS, destacou:
“O que mais me surpreendeu foi a qualidade de vida das famílias na zona rural, que têm água, energia elétrica, internet… elas estão felizes lá.”
Ela também refletiu sobre os sonhos da juventude somali:
“Chamou a atenção a paz no campo, sem medo de violência. Nosso sonho é ter paz também na Somália, para uma vida segura e de qualidade para os jovens.”
André Rocha ressaltou a importância de uma equipe jovem e diversa para o impacto futuro:
“Destacamos a equidade de gênero na composição da equipe, com três homens e duas mulheres, todos jovens, o que aumenta a esperança de que haja intensa partilha de saberes. Os visitantes expressaram muita admiração por coisas que para nós são básicas, como o estoque de água de chuva também para a produção de alimentos. Isso demonstra que a visita foi inspiradora.”
O intercâmbio reafirma o papel do Semiárido Brasileiro como referência para outras regiões áridas do mundo, especialmente no Chifre da África, que enfrenta desafios climáticos semelhantes. Para o Irpaa, o objetivo é que atividades como estas formem multiplicadores, adaptando e replicando tecnologias sociais e fortalecendo suas comunidades.


Com eventos climáticos extremos se intensificando globalmente, experiências como essa mostram que soluções baseadas no conhecimento dos povos e comunidades da Caatinga, na organização comunitária e na convivência com o meio são caminhos viáveis e replicáveis – e que os diálogos entre Brasil e Somália podem semear novas formas de resiliência para ambos os povos.
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Texto: Eixo Educação e Comunicação do Irpaa
Fotos: Equipe Irpaa