No território sertão do Araripe pernambucano, a agricultura familiar é uma atividade econômica predominante, conforme diagnóstico do “Estudo de Viabilidade Econômica e Ecológica dos Agroecossistemas do Araripe”, realizado pela Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), em 2016. Foi nesse ambiente, que Produção e geração de renda foram temas do segundo módulo de formação do grupo de multiplicadores e multiplicadoras do projeto que debate a Convivência com o Semiárido e Adaptação às Mudanças Climáticas, executado pelo Irpaa, com apoio da Caritas Alemã.
A formação foi realizada em Ouricuri, Pernambuco, entre os dias 23 e 25 de julho, reunindo lideranças comunitárias e agentes que realizam assessoria na linha da Convivência com o Semiárido nos municípios de Ouricuri, Bodocó, Araripe, Granito e Ipubi. Durante os três dias de formação, o grupo discutiu a respeito das diversas formas de produção: agricultura convencional, a qual utiliza-se de insumos químicos e apresenta uma forte dependência do mercado; e produção agroecológica, onde a agricultura é ambientalmente sustentável, economicamente e socialmente justa.
Nessa perspectiva aconteceram estudos teóricos e práticas sobre os fundamentos da criação e manejo animal e de cultivos vegetais apropriados ao Semiárido. O colaborador do Irpaa Luís Almeida, que contribuiu no debate, destacou a necessidade de compreender a importância da matéria orgânica e as características do solo para garantir produção de qualidade. “No Semiárido brasileiro a matéria orgânica é fundamental pra que a gente consiga garantir a fertilidade natural desse solo”, afirma Almeida.
Ele ainda defende a ideia de olharmos para o solo como uma estrutura viva, “o solo vivo é uma base pra gente pensar numa mudança de qualidade de vida, tudo vai partir da qualidade de vida do solo. O que é diferente do capital e do agronegócio, que enxerga o solo basicamente como uma estrutura morta que só serve para segurar planta, como suporte, e que toda fertilidade pode ser suprida através da fertilização química, sintética e de alto custo, que acaba degradando os microrganismo. Então, é preciso a compreensão do solo vivo, com essa ideia, pra colocar a vida e qualidade biológica em primeiro lugar” , argumenta Almeida.
Em sinergia com a ideia de Almeida, a jovem multiplicadora Samara Santana, da comunidade Sitio Lagoa de Pau Ferro, Ouricuri, pretende colocar em prática o cuidado com o solo, e que toda a discussão vai auxiliar na sua proposta de implementar junto com seus familiares o recaatingamento em sua propriedade. “A formação desse módulo está me ensinando como cuidar da terra, como fazer com que a terra, que tá aparentemente infértil, volte a vida”, avalia. Ela aponta mais aprendizados que teve ao longo do encontro: “A adubação e manejo corretos, as plantas que devo utilizar pra fazer uma camada morta e proteger o solo, as coisas que devo utilizar pra fazer o solo ser fértil novamente para eu poder avançar com meu projeto de recaatingamento” , argumenta Samara.
Um dos motivos que estimulou a jovem a pensar em recaatingar é a relação do desmatamento com as mudanças climáticas. “Cada ano, cada produção que passa é um desafio, mas a gente tá aqui com o desafio e não podemos deixar a Caatinga morrer. É isso que tá também servindo como incentivo”, a jovem ainda complementa que o desmatamento, o uso excessivo de veneno e não respeito com a caatinga têm agravado as mudanças climáticas.
Em relação as mudanças climáticas e seus impactos ao modo de produção, André Rocha, colaborador do Irpaa e coordenador do projeto, pontua que “ a gente compreende que são desafios maiores, porque o clima tá mudando, talvez essa geração não alcance uma alteração no tipo de clima de semiárido em si para um árido, por exemplo. Entretanto, já é perceptível nos últimos 30 anos, tanto a distribuição como o volume da chuva, tem salterado e tem alterado para um condição mais complexa do ponto de vista da viabilidade de cultura mais sensíveis, de cultura vegetais e animais defendidas por nós”, explica Rocha. Por isso, a maior necessidade de estudar quais especieis e manejos apropriadas a realidade semiárida, considerando que cada vez mais teremos condições adversas ligadas ao clima semiárido, defende André.
Produção e Comercialização no sertão do Araripe
Para contextualizar ainda mais debate com a realidade do sertão do Araripe, o colaborador do Caatinga, Ariagildo Vieira da Silva, apresentou o cenário da agricultura familiar na região e que a partir de estudo foi possível diagnosticar que produção os agricultores e agricultoras conseguem gerar mais renda do que a atividade gesseira na região. “ O estudo nós dar condições de levar para a sociedade e dizer que essa região nossa, que muitas pessoas acham que a economia mais importante aqui gira em torno das industrias do gesso, na verdade, a economia mais importante está dentro da agricultura familiar. É a que mais emprega, que gera mais renda e que dar mais condições ao território se desenvolver”, explica Ariagildo.
Espaços que contribuí para comercialização dos produtos oriundos da agricultura familiar são as feiras agroecológicas e os mercados institucionais, tema que foi discutindo na formação. O colaborador da ONG Chapada, Tales Antônio de Oliveira, compartilhou a experiência dos/as agricultores/as na construção das feiras agroecológicas, defendendo as feiras não apenas como espaço de comercialização, mas também formativo e mobilizador para acessar novas políticas públicas, além de ser uma vitrine para defender a agricultura familiar. “ É a partir dali [Feira] que eles se fortalecem no sentido de tá buscando novas parcerias, novos mercados, como também participando de projeto, divulgando suas experiências para outras regiões, de intercâmbios”, pontua Tales.
Convivência com o Semiárido e adaptação as Mudanças Climáticas
A participante da formação, dona Jacira da Conceição Souza já está animada para compartilhar o debate desse segundo módulo com sua comunidade e os demais espaços que ela integra. “ Do primeiro módulo eu já inicie a discussão na comunidade. Na reunião com associação eu já mostrei as cartilhas, falei sobre o filtro caseiro e já disse que dessa vez só mostrei, mas que vou nas comunidades para juntos fazermos o filtro e outras práticas”, pontua a Jacira . Essa é a proposta do projeto, que as participantes e os participantes a cada módulo trabalhem juntos, as suas entidades, movimentos e comunidades, os conteúdos e práticas discutindo nas formações.
Além de Pernambuco, o projeto atuará em Piauí, Bahia, Sergipe e Alagoas, trabalhando processo de formação modular e no Território Sertão São Francisco, com ação de formação e implementação de estrutura de uso didático e pedagógico-experimental de reuso de água, captação e manejo de água de chuva e no Nível de Semiárido – desenvolvendo ações de formações e mobilizações juntos a entidades e movimentos sociais parceiros, ao longo de três anos.
Texto e Foto: Comunicação Irpaa