Entre aromas, panelas e vozes em movimento, a Cozinha Agroecológica Dandara dos Palmares se tornou um dos corações pulsantes do 13º Congresso Brasileiro de Agroecologia (CBA), que aconteceu entre os dias 15 e 18 de outubro em Juazeiro (BA). Instalada ao lado do refeitório Maria Bonita, a cozinha simboliza a soberania alimentar e a força da articulação entre movimentos sociais, conectando o campo e a cidade.
Os militantes do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), da Rede Povos da Mata e da Central da Caatinga se uniram para fornecer alimentos que compõem refeições diárias às mais de 6 mil participantes.
Durante o evento, a coordenação da cozinha agroecológica estimou que foram servidas 22 mil refeições, utilizando 30 toneladas de alimentos, com um cardápio composto por 52 produtos agroecológicos e orgânicos, sendo 32 certificados, como hortaliças, legumes e extrato de tomate. Somente no almoço de quinta-feira (16), Dia Mundial da Alimentação, foram distribuídas mais de 1.200 refeições e 300 cestas agroecológicas com alimentos da agricultura familiar, em uma grande Ação Contra a Fome organizada pelo 13º CBA.
Toda essa operação foi executada e apoiada pelo Governo Federal, por meio da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), através do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) Compra Direta, do Programa Bahia Sem Fome e da Central da Caatinga, que acolheram a estruturação da proposta, garantindo a qualidade e a sustentabilidade da iniciativa.

Mais do que alimentar, a experiência é política. “Essa alimentação foi pensada e estruturada a partir da produção de comunidades que praticam a agroecologia. São mais de 50 itens vindos de 15 municípios diferentes, certificados como orgânicos, como folhosas, legumes, verduras, alimentos produzidos de forma saudável e justa”, explica Léo Márcio Araújo, militante que compõe a comissão nacional do MPA.
O cardápio, montado com cuidado para contemplar diferentes culturas e hábitos alimentares, valorizou a diversidade do semiárido, recebendo alimentos da agricultura familiar do Vale do São Francisco. A equipe da cozinha contou com 80 pessoas, de cinco estados — Bahia, Piauí, Sergipe, Pernambuco e Santa Catarina — que atuaram em turnos rotativos, um cuidado que visa preservar o bem-estar de quem cozinha e serve, permitindo também que elas vivenciassem o congresso.
As vozes dos beneficiados refletem o impacto desse trabalho coletivo. “A gente comeu bem, o almoço foi ótimo, adorei. Os alimentos da agricultura familiar foram importantes”, contou Maristela Celina da Costa, da Associação de Pescadores de Remanso (BA). Já Kaline Potiguará, indígena da comunidade Marajó, no Rio Grande do Norte, localizada no município de João Câmara, celebrou o gesto como resistência: “Na nossa aldeia, a luta é produzir sem veneno. Chegar aqui e vivenciar essa alimentação nos dá mais força para continuar.”
Com atenção ao impacto ambiental, a cozinha também adotou materiais sustentáveis na estrutura do refeitório. Os pratos e talheres utilizados nas refeições foram produzidos a partir do bagaço de cana-de-açúcar, material biodegradável e reciclável que substitui o plástico convencional. Essa escolha reforça o compromisso do congresso com práticas que respeitam os ciclos da natureza e reduzem o acúmulo de resíduos, ampliando o sentido da agroecologia como um modo de viver e cuidar do planeta.
Além das refeições, a Cozinha Agroecológica se articula com uma frente de solidariedade: os excedentes alimentares foram destinados a iniciativas articuladas com programas como o Bahia Sem Fome e o Juazeiro Sem Fome, por intermediação do Conselho Municipal de Segurança Alimentar (CONSEA), realizando o fornecimento de marmitas para instituições da região, como o grupo Mãos Solidárias, de Petrolina (PE), um dos beneficiados da ação. Outro gesto é a entrega e montagem de cestas agroecológicas para pessoas em situação de insegurança alimentar.
A articulação da cozinha se soma ao ato público “Democracia Forte, Brasil Alimentado”, realizado na quinta-feira (16/10), na Orla II de Juazeiro (BA). A mobilização coletiva reafirmou a reivindicação do direito à alimentação e à vida digna, destacando que a soberania precisa ser também alimentar, nutrindo um gesto coletivo que envolve justiça social.

Mais do que um espaço de alimentação, a Cozinha Agroecológica Dandara dos Palmares se consolidou como uma extensão das lutas camponesas, quilombolas, indígenas e de povos de terreiro, que atravessam o 13º CBA. Construindo também um espaço de resistência, partilha e cuidado, onde o alimento serve de elo entre diferentes movimentos e gerações comprometidos com a defesa do bem-viver.





O CBA é uma organização aa Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), Serviço de Assessoria a Organizações Populares (Sasop), Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), Universidade do Estado da Bahia (Uneb de Juazeiro), Movimento dos Pequenos e Pequenas Agricultoras (MPA), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano (IFSertãoPE). Conta também com a contribuição de representantes de diversas organizações, redes e articulações da sociedade civil, instituições de ensino, movimentos sociais populares, poder público e comunidades tradicionais.
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Texto: Meiwa Magalhães | Estágiaria-UNEB
Edição: Danilo Souza
Fotos: Vagner Gonçalves