Nesta quinta-feira (04), durante a 9ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF), Paulo Teixeira, ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), anunciou a revogação do Acordo de Cooperação Técnica (ACT) nº 22/2025, com o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR). A decisão acontece após protestos da sociedade civil no 13º Congresso Brasileiro de Agroecologia, realizado em outubro em Juazeiro-BA e também durante a Conferência Temática de Assistência Técnica e Extensão Rural, realizada entre os dias 1 e 3 de dezembro; além da entrega e divulgação de uma carta aberta à sociedade com o posicionamento dos/as Conselheiros/as da Sociedade Civil integrantes do CONDRAF.
Paulo Teixeira argumentou que estava fazendo disputa de orçamento para destinar às ações da ATER, mas entendeu que o Senar, entidade vinculada à Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), ligada ao setor patronal rural não representa os movimentos sociais, segmentos da agricultura familiar, nem as empresas públicas que atuam nesse setor. Diante disso, o ministro garantiu a suspensão do acordo de cooperação técnica.
O acordo, que dizia ampliar ações de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) do SENAR para a agricultura familiar, não foi dialogado com o Comitê Permanente de ATER – CP-ATER e em nenhuma outra instância do Conselho, decisão que fragiliza um espaço de interlocução democrática entre governo e sociedade civil. Esse diálogo é importante e precisa ser mantido, porque visa elaborar, monitorar, articular políticas públicas, programas e projetos voltados para a agricultura familiar. A proposta deste ACT ignora todos os acúmulos em anos de discussões e construções coletivas sobre a Política Nacional de ATER (PNATER). Também ainda há a necessidade de fortalecer a agricultura familiar com base nos princípios da agroecologia, como defendido pelo próprio MDA, o que é fundamental para superar os desafios políticos priorizados pelo governo; e o acordo vai na contramão disso.
Outra problemática deste acordo seria o compartilhamento do Cadastro Nacional da Agricultura Familiar, que permitiria ao SENAR o acesso a informações e à base de dados da agricultura familiar de todo o Brasil. “Dados super importantes e sensíveis. Então, a gente estaria entregando esses dados na mão de um órgão que historicamente esteve ligado ao setor do agronegócio”, destacou Aniérica Almeida, coordenadora técnico-pedagógica do Centro Sabiá, integrante da Rede ATER NE de Agroecologia e representante da sociedade civil no CONDRAF.
Apesar da dificuldade de diálogo durante a reunião, as motivações contrárias foram novamente apresentadas para o ministro. “O SENAR, sempre esteve ligado ao setor do agronegócio, numa perspectiva de assistência técnica muito pautada na transferência da tecnologia, enquanto que a gente defende uma assistência técnica e extensão rural pautada num processo educativo, num processo reflexivo e dialógico com as famílias”, explicou Aniérica.
Clérison Belém, coordenador institucional do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), integrante da Rede ATER Nordeste de Agroecologia e representante da sociedade civil no CONDRAF celebra o recuo do ministério: “Essa é uma grande conquista da sociedade civil, tendo em vista que vários movimentos de todo o Brasil se articularam para questionar a falta de transparência desde a construção do acordo até sua publicação e que isso fere os princípios da transparência, do debate público, da participação social; além das questões ideológicas, políticas e técnicas”.
Clérison reforça ainda que é fundamental potencializar as iniciativas que defendem e seguem princípios de sustentabilidade. “Temos projeto de desenvolvimento do campo, que é a Agroecologia, que é garantir que os povos tradicionais se mantenham no campo com alimento de verdade e com dignidade, garantindo seus direitos; mas fora dessa lógica exploratória, comercial, que o agronegócio vem querendo implantar nas comunidades”.
É preciso ainda reivindicar os recursos disponibilizados ao SENAR, originados das contribuições dos impostos pagos pela própria agricultura familiar. “A gente quer sim utilizar esse recurso, mas a gente não quer que o SENAR execute essas ações lá diretamente no campo, pois a gente quer garantir o direito das famílias agricultoras a partir dos processos da agroecologia, a partir dos processos emancipatórios dessas famílias”, finaliza Aniérica.
A revogação do ACT entre MDA e SENAR é uma conquista da agricultura familiar e da Agroecologia. Inclusive, é um resultado que reforça a importância dos conselhos, redes de ATER e articulações das organizações da sociedade civil para defender os princípios e pautas, em prol de um projeto de campo e de sociedade que valorize os conhecimentos produzidos e os modos de viver dos povos e comunidades tradicionais.
Lorena Simas
Coletivo de comunicação da Rede ATER Nordeste de Agroecologia





