Durante o lançamento de livros no 13º Congresso Brasileiro de Agroecologia (CBA), em Juazeiro (BA), três publicações chamaram atenção por expressarem experiências coletivas de mulheres na construção da agroecologia. Essas obras reúnem saberes, práticas e reflexões que mostram que a agroecologia só se realiza plenamente quando o feminismo das mulheres está presente em cada prática e decisão.

Uma delas é a obra construída coletivamente “Sementes da resistência: mulheres agricultoras construindo territórios livres”. O trabalho, desenvolvido pela Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) com apoio da Fundação Heinrich Böll Stiftung, relata o papel fundamental das agricultoras na manutenção de quintais produtivos e na resistência ao avanço do agronegócio. “Foi um processo transformador, feito por mulheres e para mulheres, que revela outros modos de produzir e de cuidar”, afirmou Marina Tauil.
A publicação reúne o percurso de 71 mulheres de Alagoas, Ceará, Paraíba e Pernambuco, entre 2021 e 2023. Além de um registro mostrando a potência das mulheres construírem os próprios caminhos, ela fortalece redes de cuidado, organização e preservação da agroecologia em seus territórios.


Outra cartilha lançada, “Escola Marias – agricultoras urbanas e periurbanas na região metropolitana de Recife”, do Centro de Desenvolvimento Agroecológico Sabiá (PE), surge de um processo formativo com mulheres da agricultura urbana. Ela reúne experiências de quem cultiva hortas em territórios urbanos e periféricos, abordando técnicas de manejo e questões de feminismo, como divisão sexual do trabalho e violência.
“Com esse projeto, a gente também aponta caminhos de desafios e perspectivas, para que essa experiência possa alcançar outras mulheres”, explicou Aniérica Almeida.
A formação que originou a cartilha buscou unir conhecimento técnico e reflexão crítica. Além das práticas agroecológicas, as participantes estudaram direitos sexuais e reprodutivos, relações de gênero e organização comunitária. As educadoras, todas agricultoras urbanas, também participaram da construção dos conteúdos, reafirmando a importância de espaços de formação conduzidos por e para mulheres e fortalecendo o protagonismo feminino.

Completando o trio de obras, foi apresentada “Tecendo redes de Economia Solidária com Mulheres Rurais”, escrita por Seomária Costa, extensionista rural e pesquisadora que atua no Vale do Jiquiriçá e no Baixo Sul da Bahia.
Baseado em suas vivências profissionais, o livro analisa a economia solidária a partir da perspectiva das mulheres agricultoras e reúne relatos sobre como esse modelo fortalece a autonomia e a autoestima no campo. “Depois que conheceram a economia solidária, muitas começaram a se valorizar e a não aceitar mais a violência”, contou a autora.
Ela ressalta que o reconhecimento do trabalho das mulheres rurais ainda é um desafio, já que a maioria acumula funções dentro e fora de casa, sem que esse esforço seja valorizado.
“O livro é uma forma de dar visibilidade a esse trabalho e de mostrar que são essas mulheres que sustentam a vida no campo”, afirmou Seomária. A publicação transforma dados e depoimentos em um retrato fiel da realidade das agricultoras que alimentam as cidades.

Essas obras destacam diferentes dimensões do mesmo movimento: o de mulheres que constroem e compartilham conhecimento. Ao narrar suas trajetórias, elas reafirmam que a agroecologia é também um campo de disputas simbólicas e políticas, em que reconhecer o lugar das mulheres nesse processo é essencial para o futuro da produção de alimentos e da justiça social.
O CBA foi organizado pela Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), Serviço de Assessoria a Organizações Populares (Sasop), Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), Universidade do Estado da Bahia (Uneb de Juazeiro), Movimento dos Pequenos e Pequenas Agricultoras (MPA), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano (IFSertãoPE). Conta também com a contribuição de representantes de diversas organizações, redes e articulações da sociedade civil, instituições de ensino, movimentos sociais populares, poder público e comunidades tradicionais.
_
Texto: Meiwa Magalhães – Estagiária (UNEB)
Edição: Danilo de Souza
Fotos: Wickshinney Ribeiro, Karen Lima e Meiwa Magalhães