Pela primeira vez, Canudos terá famílias com sistemas de saneamento rural com reúso de água

Cinco famílias do município de Canudos-BA foram selecionadas para implantação de tecnologias de reúso de água. Essa iniciativa faz parte de experimentações que estarão em fase de teste por um ano. Durante o período, os/as contemplados/as receberão acompanhamento técnico mensal, desde a implantação até o funcionamento e com atividades de monitoramento da qualidade da água, volume e aspectos gerais.

A implantação das tecnologias acontecem no âmbito do Programa Uma Terra e Duas Água (P1+2), da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), como parte do aditivo ao termo de cooperação entre o Ministério do Desenvolvimento Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) e ASA. Esse novo aditivo prevê a seleção de 45 famílias distribuídas nos nove estados do Nordeste: Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe e Bahia, além de Minas Gerais. 

Cada estado selecionará cinco famílias a serem contempladas com o sistema de reúso de águas cinzas (RAC): Bioágua familiar e Bacia de Evapotranspiração (BET). Para isso, as famílias selecionadas devem atender ao critério, previsto no projeto, de  utilizar a cisterna calçadão de 52 mil litros para a produção de alimentos e/ou dessedentação animal. Essa fase de teste é importante e necessária para que as famílias se apropriem do sistema e percebam a viabilidade da tecnologia em conjunto com a prática de captação e armazenamento de água da chuva através da cisterna calçadão. 

Após mais essa experimentação, a expectativa é que essas tecnologias possam se transformar em políticas públicas e que mais famílias sejam contempladas, inclusive a ASA já tem um Programa de Saneamento Rural com reúso de água, aprovado no X EnconASA.

“A gente sabe dos desafios de transformar isso em política pública, mas a gente também sabe que não há outro caminho senão aumentar cada dia mais o número de pessoas e lideranças sensibilizadas para essa causa. E assim criar uma mobilização nacional que possa tensionar o poder público municipal, estadual, ministério, para que isso torne uma política pública. Então, é mais um passo que a gente dá, ampliando o número de municípios, de lideranças, de comunidades e famílias que se sensibilizam, que têm oportunidade de se apropriar. E mostrar para a sociedade que isso é bom, que isso dá certo, que isso é possível, e assim a gente vai criando essa mobilização”, enfatiza o colaborador do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), André Rocha.

O reaproveitamento possibilita que as famílias melhorem a gestão da água na propriedade e consigam potencializar a produção animal e agrícola. André Rocha também destaca que essa é uma oportunidade de trabalhar e discutir sobre o reúso de água para fins agrícolas em Canudos, já que em outros municípios do Território do Sertão do São Francisco essa discussão já está em pauta e os sistemas estão sendo implementados por outros projetos. 

Troca de saberes e diagnósticos

As famílias baianas contempladas são assessoradas pelo Irpaa, que também está executando o P1+2. Para também potencializar as discussões sobre a importância do saneamento rural e proporcionar troca de conhecimentos sobre as tecnologias, foi realizado um intercâmbio no dia 15 de abril, no município de Juazeiro-BA. Participaram da atividade cerca de 12 pessoas das comunidades canudenses: Sítio Antônio Josina, Rio Soturno, Barriguda, Juá, Sítio Tomaz, Arara e Angico.

Durante esse intercâmbio, o grupo conheceu a história das famílias e como acontece a gestão e reutilização da água. Nesse sentido, foram discutidos temas como o processo de construção do bioágua familiar, funcionamento, manutenção, manejo, limpeza e reutilização apropriada da água.

 

Anteriormente, essas famílias participaram das visitas de diagnóstico, realizadas por colaboradores/as do Irpaa e integrantes da Comissão da ASA, em Canudos. As atividades tiveram o objetivo de identificar experiências das famílias que fazem uso da água da cisterna calçadão de 52 mil litros para fins domésticos e produtivos, com foco principal nas famílias que fazem o abastecimento da cisterna, exclusivamente, com água de chuva. 

A agricultora Gilnete Rodrigues, da comunidade Rio do Soturno, uma das selecionadas para receber a tecnologia, afirma que tudo o que viu é uma novidade. “O que mais me chamou a atenção foi esse reaproveitamento das águas que a gente usa, que vai tudo para fora. A gente não usava para nada, não usava até algum momento, só ouvia falar que tinha esse reaproveitamento, só que na nossa comunidade nunca tinha acontecido um momento de reunião para explicar”. Ela complementa, ressaltando que a chegada da tecnologia de saneamento com reúso de água é a realização de um sonho:

“Eu tinha em minha mente uma vontade de ter um local de fruteiras, não para comercializar, para o meu uso; porque eu sei o que eu tô usando, o que eu tô produzindo; então, eu tinha esse sonho e agora eu acho que tem como eu realizar esse sonho”.

O sonho, que é um direito, dessa e de outras famílias pode e deve ser transformado em realidade, basta que os governantes coloquem em prática o Plano de Saneamento Básico, que está previsto para execução em todo o país. Esse plano é um instrumento essencial para o planejamento e gestão dos serviços de saneamento nos municípios; nele são definidas as diretrizes, objetivos e ações para garantir o acesso universal a serviços de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto, resíduos sólidos e drenagem pluvial. 

De acordo com a lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, alterada para a lei  14.026/ 2020, a legislação estabeleceu metas para a universalização dos serviços de água e esgoto até 2033. A lei faz uma projeção que até essa data, 99% da população brasileira deverá ter acesso à água potável e, ao menos, 90% dela deverá ter o esgoto coletado e tratado. Mas, mesmo que o saneamento tenha sido colocado como prioridade nacional, sua implementação enfrenta uma série de desafios que precisam ser superados para o alcance das metas. 

Dentre esses desafios estão as desigualdades entre famílias da cidade, periferias e do campo, falta de infraestrutura básica, formação dos/as profissionais, falta de gestão dos recursos destinados para os serviços de saneamento básico e falta de fiscalização. Para que esses e outros desafios sejam superados é necessário mobilizar diversos atores, órgãos, poder público, população, organizações da sociedade civil, para que juntos busquem estratégias e caminhos viáveis para que todas as famílias tenham direito ao saneamento básico, independente de residirem em comunidades rurais ou nos grandes centros urbanos.

Texto e fotos: Eixo Educação e Comunicação do Irpaa

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