Hortaliças, verduras, derivados do peixe, biscoitos, bolos, iogurte, mingau de milho, ovos caipira, doces, geleias, mel, manteiga, cereais e dezenas de outras variedades de alimentos e produtos oriundos da agricultura familiar do Território Sertão do São Francisco estavam expostos, na manhã desta sexta-feira (12), no auditório do Espaço Plural da Univasf, em Juazeiro. A demonstração do potencial produtivo de agricultores/as familiares ocorreu ao longo do Encontro Territorial para Organização do fornecimento de gêneros alimentícios da agricultura familiar, em atendimento ao Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE.
O evento foi realizado pela Superintendência da Agricultura Familiar do Estado da Bahia (SUAF) para debater a importância da agricultura familiar para a segurança alimentar no Estado. Compareceram ao Encontro cerca de 90 pessoas, representando cooperativas, associações, gestores/as públicos, Central da Caatinga, Codeter, organizações não governamentais como o Irpaa, Sasop, Setaf, Conselhos municipais e Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional, Secretarias de Agricultura e Educação de alguns municípios, Sindicatos da Agricultura Familiar e Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf).
O Superintendente da Suaf, Ademilson da Rocha (Tiziu), explica que o evento também teve o objetivo de debater com os municípios como cada um pode avançar na compra dos produtos da agricultura familiar, além de aproximar e estreitar as relações entre entidades de Ater, empreendimentos e gestores/as municipais para avançar com o PNAE no Estado. Ele informa que 7 dos 10 municípios do Territórios cumpriram com a meta de comprarem, no mínimo, 30% dos produtos da agricultura familiar, “as prefeituras podem comprar 40%, mas pode comprar até 100%”, defendeu.
“O que a gente necessita é que haja uma compra maior ainda, a gente consegue ir além desses 30%”, pontua Simone Santarém da Associação da Fazenda Santarém, em Casa Nova, sobre o potencial dos grupos em fornecer alimentos para a alimentação escolar. Ela diz ainda que é preciso que os gestores se sensibilizem e invistam nos grupos, garantindo assistência técnica para o beneficiamento e serviço municipal de inspeção sanitária. “A gente não consegue vender produtos de origem animal em Casa Nova. Não tem abatedouro. O município perde muito dinheiro e, com isso, está perdendo de fazer incentivo e investimento na agricultura familiar”, argumenta Simone.
Entrega do Selo
Outro momento do Encontro foi a entrega de mais de 180 Selos de Identificação da Participação da Agricultura Familiar (SIPAF) de mais de 12 empreendimentos do Território, demonstrado a riqueza e a diversidade de alimentos que podem chegar na mesa das unidades de ensino dos municípios. Para os grupos, o recebimento do selo contribui para que os produtos possam ser comercializados nos mercados e também tenha isenção de Imposto sobre circulação de mercadorias e prestação de serviços – ICMS.
A cooperativa de Sento Sé foi uma das que recebeu o selo e na avaliação da Presidenta, Raildes Alves do Santos, será uma possibilidades de vencer o entrave de acesso aos mercados, que no último ano a Associação ficou de fora porque não tinha o selo. A cooperativa já disponibiliza para as escola dos municípios polpa de frutas, verduras e outros alimentos. “nós precisávamos muito desse selo, pois para entregar nossos produtos é uma dificuldade muito grande”, afirma.
O presidente do Consea Estadual, José Moacir dos Santos, avalia como positivo a entrega dessas certificações, mas argumenta que é apenas um passo para avançar no setor, “não está resolvido, mas é um passo de reconhecer no território que a agricultura familiar tem, pelo menos, 180 produtos e de qualidade, bons de serem ofertados na alimentação escolar. Isso é um grande ganho. Queremos que fortaleça o olhar do gestor municipal para esse empreendimento e o ajude a resolver questões burocráticas de comercialização”, argumenta.
Desafios
A expectativa das associações e cooperativas presentes é conseguir disponibilizar estes alimentos para a merenda escolar da região, uma vez que a demanda existe e a disponibilidade de alimentos saudáveis e produzidos por famílias também. “A gente está com uma produção bem elevada. A gente espera conseguir atingir o mercado da merenda escolar, pois tem escolas perto da gente e a gente não conseguiu vender”, argumenta Gilmar Nogueira Lino, da Cooperativa Agropecuária Familiar de Massaroca e Região (Coofama), que mantém o entreposto de Ovos da Caatinga, o primeiro a receber a Certificação do Serviço de Inspeção Municipal de Juazeiro – SIM.
Moacir esclarece que o PNAE é uma luta da agricultura familiar e que não houve avanços por parte do estado, “o Estado não conseguiu comprar da agricultura familiar por conta da burocracia exigida que não é compatível com a agricultura familiar”. No entanto, ele acredita que a entrega do selo abre caminhos para o setor consiga acessar o mercado institucional.
O Superintendente da Suaf reconhece que o governo do Estado também precisa avançar nessa política de alimentação escolar e afirma que há um empenho conjunto entre a Secretaria de Desenvolvimento Rural e a Secretaria de Educação do Estado para avançar nesse processo. A expectativa, segundo Tiziu, é que a Seduc lance uma chamada pública do PNAE nos próximos meses, “ A ideia da chamada territorial é que consiga valorizar os empreendimentos que estão ali no seu Território, atender a demanda que estão ali das escolas e a entrega dos selos vem para garantir que agricultura familiar consiga vender seus produtos”, afirma.
Um dos desafios também é a regularização dos produtos com vistas a segurança sanitária. Moacir explica que “a política de agroindústria não favorece a agricultura familiar. A discussão que tem hoje no Consea junto ao poder público é no sentido de apropriar a lei, a política de vigilância sanitária ao perfil da agricultura familiar, de pequenas unidades de beneficiamento”. Com a criação dos Serviços de Inspeção Sanitárias nos municípios, Selos municipais e territoriais, a expectativa das cooperativas e associações de agricultores/as familiares é conseguir que seus produtos de qualidade alimentem cada vez mais as famílias da região, garantindo não só a geração de renda para os grupos, mas a segurança alimentar da população.
A maioria dos municípios não têm esse serviço de inspeção e os que têm ainda são muito proibitivos porque seguem a lei estadual, que é fora do contexto da realidade da agricultura familiar.
No Território Sertão do São Francisco apenas o município de Juazeiro tem o Serviço de Inspeção Municipal regulamentado através da lei 2.785/2018 e o Selo através da lei Municipal 2.786/2018. Os demais municípios do Território se comprometeram em criar e regulamentar o SIM, mas sem uma perspectiva de quando isso possa ocorrer.
“A nossa agricultura familiar precisam ser cada vez mais valorizada… precisa fortalecer a sua base produtiva, a assistência técnica, a convivência com o semiárido, os processos organizativos … e vencer o gargalo de registro de alimentos e produtos de origem animal, precisa avançar para colocar esses alimentos em rede varejista. O SIM é uma alternativa para isso”, argumenta Tiziu. Rocha afirma ainda que o Estado tem se colocado para apoiar os Consórcios territoriais em criar e regulamentar o SIM nos territórios, como uma forma de potencializar e criar estratégia de comercializar os produtos em todo o Estado.
O presidente do Consea argumenta que reflete a ausência de reconhecimentos dos governos municipais em valorizar a produção local de alimentos. “Ainda há essa indiferença do gestor municipal com o poder de produção e de oferta de alimentos que o município dele tem, geralmente, estão acostumados comprar de fora os produtos industrializados, e poucos são os que enxergam hoje a realidade positiva do seu município que é produtor de alimentos. A luta dos empreendimentos é que sejam visibilizados, oportunizados os espaços para essa comercialização”, pondera.
Além da exposição dos produtos, estavam na pauta a avaliação do PNAE no território, Chamada pública territorial, Guia para credenciamento no sistema de compras do Governo da Bahia. Ao final, foi criada a comissão territorial do PNAE com a representação de segmentos da agricultura familiar, órgãos públicos e governo do estado.
Texto e Foto: Comunicação Irpaa