A questão da terra foi um dos temas de discussão do 10º Festival do Umbu, que ocorreu nos dias 27 e 28 abril, em Uauá. Na mesa que pautou a “Lei Estadual de Fundo e Fecho de Pasto”, foram discutidos os avanços e retrocessos sentidos pelas comunidades, além dos desafios para os próximos anos.
De acordo com o bacharel em direito Cosme da Silva, “as Comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto iniciaram o processo de reconhecimento ainda na década de 80, a partir do requerimento para a medição dessas comunidades”. Desde então são constatados avanços, inclusive o reconhecimento legal da posse da terra pela Constituição Baiana e, mais recentemente, a criação da Lei 12.910/13, que dá a concessão dessas terras às famílias que ali vivem.
Ao tempo em que cita a evolução, Cosme critica os retrocessos que afetam as comunidades. Na opinião dele “podemos afirmar que, de 2007 a 2018 não houve avanço significativo na questão quantitativa de documentos ou instrumentos jurídicos que garantissem a terra para essas comunidades”.
Um exemplo de retrocesso citado por Cosme, é a própria Lei 12.910/13. A norma diz que o Estado da Bahia fica responsável por declarar a existência das comunidades de Fundo de Pasto, no entanto, a declaração só pode ser feita após as comunidades entrarem com o processo administrativo e serem certificadas pela Secretaria de Promoção da Igualdade Racial – Sepromi. No final do processo, a comunidade terá apenas um contrato de 90 anos, que pode ser prorrogado, mas tal contrato não dá as mesmas garantias de um título de terra.
O Festival do Umbu foi palco para entrega de certificados a 62 Comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto, em 17 municípios, dentre esses, Remanso, Uauá, Canudos, Jaguarari, Curaçá, Campo Formoso, Campo Alegre de Lourdes e Pilão Arcado. Para a representante da Sepromi, Fabya Reis, a iniciativa abre as portas para que os Fundos de Pasto tenham acesso a outros direitos, além de fortalecer as questões de identidade e território.
Para José Odailson, da comunidade Santo Antônio, em Curaçá, o certificado representa uma luta de muito tempo pela garantia da terra e proteção das áreas coletivas, que podem sofrer com a ação de latifundiários e mineradoras, os quais nos últimos anos aumentaram significativamente em Curaçá. Apesar da felicidade com a conquista recente, José Odailson espera mais: “a gente sonha em garantir um documento mais ‘legal’ que possa nos dar direito a dizer que temos uma área verdadeiramente identificada como Fundo de Pasto”, almeja ele.
Durante o Festival do Umbu faixas demonstravam a insatisfação das comunidades com o prazo final (31 de dezembro de 2018) para se autoidentificar. Segundo Tatiana Dias Gomes, que integra a Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia – AATR, há uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal objetivando suspender os efeitos da Lei de Fundos de Pasto, contudo ela alerta que “é preciso continuar pressionando o Legislativo e o Executivo baiano”, no intuito de revogar a lei.
Texto: Ingryd Hayara
Colaboração, edição e foto: Comunicação Irpaa